domingo, 30 de novembro de 2008

‘The Twilight Zone’

O trânsito tem muitos mistérios. O mais enigmático deles acredito que seja o da luz de ré. Sabiamente, as fabricantes de veículos desenvolveram os faróis traseiros dos veículos com três tipos de lente - a vermelha indica frenagem, a amarela aponta aonde o motorista irá virar ou um alerta (quando as luzes dos dois lados piscam ao mesmo tempo) e a transparente, que muita gente chama de branca, deixa bem claro que a marcha a ré foi engatada -. Por acaso é difícil entender a mensagem “atenção, esse carro começou a andar para trás, portanto, não passe por aqui!”?

Difícil não, é impossível. Engate a ré e verá. Vão passar atrás do seu carro todos os velhinhos que estão na rua, dez crianças brincando com uma bola de futebol, o pipoqueiro, o tio que vende algodão doce e uma mulher com um carrinho de bebê. E olha, a sinalização sonora que existe em alguns caminhões não adianta nada, as pessoas ficam hipnotizadas pela luz de ré do mesmo jeito.

Como pode? Restam-me duas teorias: ou é o mesmo conceito da atração das mariposas aos postes de luz ou é um fenômeno sobrenatural digno de ser representado no extinto seriado “Além da imaginação.” Porque isto acontece na padaria, supermercado, estacionamento de shopping, na rua de casa, na garagem do prédio, no parque, na frente da igreja…

O pior é que você é obrigado a ficar parado com aquela cara de bobo esperando todo mundo passar. Quando consegue tirar o carro do lugar, ainda há o medo de atropelar alguém que ficou no ponto cego do espelho, afinal, ninguém está livre dos zumbis da ré.

quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Extra, extra!

Acordar cedo para trabalhar sempre é um grande desafio. Confesso que meu humor não é dos melhores nas primeiras horas do dia. O trânsito colabora bastante com o sentimento de viver o clássico `Um dia de fúria`. Talvez seja por isso que algum gênio do marketing inventou as esverdeadas mocinhas que entregam o jornal gratuito Metro.

Aquela roupa fluorescente parece um oásis de alegria no cinza da cidade. As entregadoras do jornal, a maioria baixinha, estão sempre sorrindo com um exemplar na mão, é contagiante. Só tem um problema, elas nunca entregam o tal do jornal para mim. Frustrada pelo abandono, decidi mudar a tática de abordagem – meio limitada por estar dentro do carro.

Imaginei que, por causa do meu mau-humor matinal, ficasse com cara brava, fechada. Então, resolvi sorrir. Foi só o primeiro sinal fechar e eu abri aquele sorriso enorme, cheio de dentes. Não adiantou. A mocinha saltitante não quis nem saber e pulou meu carro.

No dia seguinte, inconformada, decidi não usar óculos de sol. Os olhos devem sorrir junto, eu pensei. Olhei para a cara da mulher e sorri com aquele olhar de “eu quero muito ler esse jornal.” Que nada, ela ficou interessa mesmo foi no taxista que estava de graça. Perdoei, afinal, a moça tem todo o direito de flertar.

Depois disso, adotei a tática da janela. O meu carro nunca fica com o vidro fechado, mas dessa vez escancarei a janela e coloquei o “bração” para fora. Resultado, meu braço quase foi levado por um motoqueiro e eu fiquei sem jornal mais uma vez.

Após duas semanas dedicadas à luta pelo Metro, resolvi deixar para lá. Quem sabe alguém do concorrente Destak passa e reconhece a minha importância como leitora, afinal sempre passo horas em congestionamentos?

Como tudo na vida, as coisas só acontecem quando a gente desencana. Lá estava eu, parada, curtindo o som do carro e viajando em meus pensamentos, quando aquela radiação verde se aproximou do carro: "moça, aceita?" Que felicidade! Peguei o jornal da mão da mocinha e a agradeci como se fosse a chave de um Volvo C30 zero quilômetro. Ela retribuiu o sorriso, o farol abriu e eu segui toda contente para mais um dia de trabalho. Foi a única vez que li esse jornal de cabo a rabo.