quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Cuidado: travessia de aviões

Tem sempre alguém no trânsito que nos irrita profundamente. Pode ser aquele moleque com som alto fazendo barbeiragens e se achando o gostoso ou o tio da Brasília que não tem mais espelho retrovisor e corta a sua frente ou uma louca que freia com tudo para ver um avião sobrevoar a Avenida dos Bandeirantes. Como sou uma pessoa abençoada pela falta de paciência, lógico que foi o pesadelo da mulher amante de aeronaves que me perseguiu.

Pegar trânsito logo que acorda não é algo muito animador. Ainda mais quando você precisa tirar o visto americano e sabe que irá encarar horas em pé, em um fila sem explicação. Estava eu em um dia afortunado desses, quando um Uno resolve pegar a faixa da esquerda.

A mulher que estava ao volante deveria ser uma daquelas pessoas que acordam sorrindo e cantando com os pássaros, pois ela andava a 5 km/h e deixava todo mundo entrar a sua frente, enquanto meia dúzia de palhaços atrás demorava uns dez minutos a mais para andar do que os motoristas da faixa ao lado. Irritada, comecei a colar a Kombi no carro da mulher, para ver se andava. E nada. A fulana cantava e chacoalhava ao som de sei lá o quê. Um passeio matinal, praticamente.

Para abrilhantar ainda mais este momento, um avião da TAM cortou o céu da avenida. Extasiada com a visão, a mulher se atrapalhou toda, socou o pé no freio e esqueceu de desengatar antes de tirar o pé da embreagem. O trânsito andou e o carro morreu. Ao invés de ligar o Uno, o que a ilustre faz? Colocou a cabeça para fora da janela e observou o avião chegar ao aeroporto. Toda atrapalhada, ela ligou o carro e manteve a toada dos 5 km/h, na tentativa de ver a pontinha do avião pelo retrovisor.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Cupido ao volante

O amor tem suas breguices e loucuras, mas o conjunto até que fica bonitinho. Há quem ache cafonérrimo se agarrar em escadas rolantes ou mandar beijos pelo ar. Questão de estilo. Outro dia a luta de um casal para conseguir trocar declarações no meio do trânsito me comoveu pela tamanha dedicação.

Tudo começou na Avenida Paulista. Ele em um carro à esquerda e, ela, à direita. Vidros abaixados e troca de olhares. Em um primeiro momento achei que fosse um daqueles xavecos furados, que a menina sairia cantando os pneus.

Que nada. Já na Vergueiro os dois pararam no farol vermelho. Dessa vez, ela à direita dele. Ela abaixa o vidro e ele... Bom, ele abre a porta. Sabe como é. Vidro quebrado. Na hora desliguei o rádio para ouvir o que rolava. Só consegui ouvir a frase dele:

- Você deve me amar muito mesmo. Olha a situação do meu carro!

Ela, com seus cabelos compridos e pele aveludada sorria e respondia algo que não entendi. Só via as milhares de bitocas enviadas através de um quarto de vidro aberto. O que me fez deduzir que o vidro dela também estava quebrado. Muita coisa em comum, não?

No semáforo seguinte, pude acompanhar o desenrolar do romance com um Peugeot 206 que também ficou de coadjuvante. Mas ele interagiu mais: ficou na faixa ao lado do romanticão e olhava para o carro da mulher. Com uma técnica nova, quando a beldade parou para declarar o seu amor, o rapaz abaixou o vidro de trás – esse sim funcionava – e continuou o flerte.

Intrigado pelo diálogo, o cara do Peugeot ficou olhando. Provavelmente, vai usar a tática da próxima vez que tentar dar uma cantada em alguém no trânsito. Afinal, o som alto e o braço pra fora nem sequer desviaram os olhares da moça. Ele acelerou e foi embora.

E os dois apaixonados seguiram caminho. De longe pude ver quando ela atendeu o celular. Era ele na linha. Enxerguei o belo rosto do amado por causa da fraca luz do aparelho celular que o iluminava. Virei na rua seguinte, mas ainda deu para ouvir as buzinadinhas de despedida.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Amigos telespectadores

Eram apenas dois carros, um caminhão do Corpo de Bombeiros e uma ambulância de resgate (‘just in case’). Não havia gritos, choro e nem aquela muvuca de gente. Era um acidente aparentemente simples, daqueles que um dos carros roda e o outro vai parar no canteiro central, mas passageiros e motoristas estão intactos.

Mesmo assim, a audiência do acidente era a mesma do último capítulo da novela das oito. Todo mundo queria ver a desgraça alheia e avaliar quanto contorcidos ficaram os carros. E eu, louca para voltar para a casa e ter um momento de tranquilidade antes de dormir, tive de enfrentar aquele trânsito às 21h de uma segunda-feira.

Fazer o quê? As pessoas adoram ver a desgraça alheia! Nenhuma buzinada da minha parte surtiria efeito. Esperei, esperei, até que o trânsito fluiu. Nada de sangue, nada de saco preto na calçada, nada de pessoas chorando e carros de ponta cabeça. Os brasileiros não tiveram o mórbido prazer de ver uma desgraça e ainda por cima perderam o capítulo da nova novela. É isso que dá trocar o “Caminho das Índias” pelo caminho de casa.

A mim, que não assisto a novelas e muito menos a acidentes, coube um sorriso de triunfo e, obviamente, uma nova história. E, melhor, sem gastar buzina.